Total de visualizações de página

quinta-feira, 22 de março de 2012

"3464... 3577... 3536"





"3464...3577... 3536”
Conhecemo-nos nos idos de 1968 nos bancos da Veneranda… como é carinhosamente conhecida a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Cursávamos então o segundo ano do curso de Engenharia, e, idealistas, havíamos escolhido a mesma especialização: Engenharia Naval! O momento era militar, e a Marinha pràticamente tinha as rédeas do curso, e tinha a fama de ser a “elite” das Forças Armadas. Além disso, na minha cabeça pelo menos, o navio era uma cidade flutuante; TODAS as Engenharias cabiam dentro de um deles, e ainda por cima o conjunto tinha de flutuar! Parecia o certo a fazer, e lá fomos nós com o nosso idealismo a toda. Éramos amigos, a amizade desinteressada e sadia que só os jovens sabem construir, e talvez fosse legítimo dizer que os três do título nem imaginavam, na época, que a amizade seria para toda a vida. Ah… o título… sim, “3464… 3577… 3536” eram os nossos números de chamada, e os sabíamos de cor porque nas aulas mais chatas, um de nós era escolhido para assinar a presença de todos na lista de presença. Não éramos “santos” não, e na verdade nosso grupo de estudos incluia outros dois colegas, o 3544 e o 3874, mas estes tomaram caminhos de vida não só diversos como os nossos, mas que não permitiram, ou não facilitaram que êles permanecessem em contato conosco ao longo dos anos. Isso não aconteceu conosco, embora nossos caminhos profissionais tenham sido extremamente diversos, incluindo até distâncias físicas internacionais. A amizade forte, cultivada, nutrida, embora iniciada na esfera profissional, começou inevitàvelmente a derramar sôbre a vida em geral. Alguns fatores fundamentais, como por exemplo, a minha esposa de 40 anos, companheira de 44, conheci-a na casa de um deles, no dia do aniversário dele! Conversamos muito, eu e ela, sem que eu soubesse que ela e o meu amigo haviam ensaiado um namoro… Quando ela se ausentou da festa com o irmão que a acompanhava, a música que animou o resto da festa foi “A Namoradinha de um Amigo Meu” do Roberto Carlos. Pràticamente havia começado naquela noite o resto da minha vida. Outros fatores mais mundanos, como por exemplo, foi também na casa desse um que eu aprendi a comer alcachofra!! Neto de italianos, estava acostumado com a alcachofra recheada, mas nunca a havia comido apenas cozida, com o molhinho vinagrete do lado, folhinha por folhinha até o fundo saboroso após a remoção dos “espinhos”. Lembro-me bem, foi em um Domingo quando estávamos estudando na casa dele, e fui convidado para o almôço. Ao sentarmo-nos na mesa já lá estava o prato de entrada na frente de cada pessoa: uma bela alcachofra, com o potinho de molho ao lado. Sem saber ao certo o que fazer, resolvi ficar olhando para o que fariam os outros sentados à mesa, quando percebi que todos estavam olhando para mim, pois eu era o convidado, e todos esperavam que eu começasse primeiro a comer, por uma questão de educação. Foram minutos constrangedores, até que a mãe dele percebeu o que estava ocorrendo, e gentilmente me ensinou o que eu devia fazer, e aí todos degustaram suas alcachofras. Vivendo e aprendendo… Fatos inesquecíveis assim só fazem reforçar a amizade. O outro amigo já namorava uma moça há um tempo e ela e a minha eleita têm o mesmo nome, e estudavam no mesmo Colégio Dante Alighieri. Além disso, descobrimos que os dois e eu havíamos sido contemporâneos na época do ginásio no Caetano de Campos, ele uns anos na frente, e ela e eu no mesmo ano, embora em classes diferentes. Muitas vezes fomos juntos buscar as meninas no Dante Alighieri… bons tempos aqueles. Tudo isso formou a base sólida de uma amizade que dura até hoje. Alguns meses após nossa formatura nos casamos com um mês de diferença, padrinhos um do outro, e… pasmem… fomos ser vizinhos na nossa primeira casa, na Chácara Santo Antônio, perto da Marginal do Pinheiros e da Rua Verbo Divino. Logo vieram os filhos para os dois casais, todos na mesma faixa etária, e amigos sólidos como os pais, até hoje já crescidos, e com seus próprios filhos, nossos netos. O outro amigo (o da alcachofra…) continuou solteiro por alguns anos depois da formatura, mas amigo sincero, continuou frequentando nossas casas sòzinho, e até comparecer nos primeiros aniversários das nossas crianças. Sacana, êle brincava que “esperaria a primeira viúva ou a primeira filha…”. Aí Deus, que tem um senso de humor, mandou uma carioca para dar um jeito nele… casaram-se cinco anos depois de nós e só tiveram FILHAS, as quais, embora um pouco mais jovens, se juntaram ao trem da amizade de nossas tres famílias. Até quando eu me mudei com minha família para os Estados Unidos continuamos a nos ver com uma certa frequência. O amigo da alcachofra se tornou Presidente da subsidiária Brasileira de uma multinacional Americana, e portanto ia aos Estados Unidos com frequência, e sempre reservava um fim-de-semana anexo à sua viagem para nos visitar. Êle foi o único amigo Brasileiro que esteve presente no casamento dos meus filhos que se casaram nos Estados Unidos. O outro amigo, embora o trabalho o levasse mais à Europa do que aos Estados Unidos, sempre que ia lá nos víamos, e também fizemos várias viagens de lazer juntos, inclusive com todas as nossas crianças. Aliás, várias vezes hospedamos os filhos deles nos Estados Unidos, e êles hospedaram os nossos filhos aqui no Brasil. Foram todos momentos inesquecíveis. Neste último fim-de-semana os três casais protagonistas dessa nossa amizade que já dura quase 45 anos adicionaram aqui em Guaxupé mais um dia e meio à essa nossa coleção de momentos inesquecíveis. Somos exemplo vivo do que diz o poeta: “Amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito…”. “3464… 3577… 3536”… PRESENTES!... sempre PRESENTES!... PRESENTES para sempre!! Uma boa semana a todos vocês, leitores e leitoras.
O autor é engenheiro, doutor em ciência da computaçao, professor universitário, e pode ser contactado através do e-mail claudio.spiguel@gmail.com).
(PENSAMENTOS No 11/2012 – Jornal da Região – ANO XVIII, No 966 – 23/03/2012).

Nenhum comentário:

Postar um comentário