No começo desta semana, mais precisamente na Segunda-feira, 4 de Julho, foi feriado nos Estados Unidos. Nessa data comemora-se a independência americana do jugo inglês, em 4 de Julho de 1776. Foi a comemoração dos 235 anos de liberdade da democracia mais duradoura da historia da humanidade. Várias vezes no passado recente eu tenho me referido aqui nesta coluna às diferenças entre as culturas brasileira e americana, não necessàriamente para estabelecer “melhores” e “piores”, mas apontando diferenças que principalmente influem na capacidade dessas culturas se tornarem líderes na aldeia global. Disse também algumas vezes que se eu tivesse de escolher UMA palavra para encapsular essas diferenças, essa palavra seria SERIEDADE. Sem muitas explicações, simplesmente o que a palavra significa: a SERIEDADE com que as culturas enfrentam seus sucessos, seus fracassos, suas vitórias, suas derrotas, suas esperanças, suas vicissitudes, enfim, as belezas e as agruras desse caminho fantástico que chamamos de vida. Abrindo aqui um parênteses, esse tema tem me custado alguns dissabores... existe um sentimento, às vezes velado e às vezes aberto, de um anti-americanismo barato que se origina, penso eu, no que eu chamo de síndrome do campeão, pela analogia com um campeonato de futebol, onde todos os times querem ganhar daquele que está defendendo seu título do ano anterior. Os Estados Unidos lideraram a aldeia global nos últimos 60 anos, no período pós-2ª Guerra Mundial, e portanto... bem, vocês, meus leitores, são bons entendedores, portanto essa meia-palavra já basta. Nos meus 62 anos de idade, encontro-me em uma posição privilegiada para analisar essas comparações, pois vivi pràticamente metade da minha existência em cada cultura, e sou membro das duas. E nada melhor que o 4 de Julho para exemplificar aquela SERIEDADE. Eu estava nos Estados Unidos no fim de semana passado, e pude observar novamente o que observei nos 31 anos que vivi lá: nos bairros residenciais pràticamente TODAS as casas mostram a bandeira americana em suas caixas de correio, em suas portas de entrada, em mastros nos jardins, no topo da chaminé, enfim, vocês entendem o espírito da coisa. Nas ruas, pessoas de todas as idades vestem roupas que tem as cores da bandeira americana, quando não a própria bandeira estilizada das mais diferentes maneiras. Crianças exibem bonés com as cores, a bandeira, e as palavras USA. É claro que não todas as pessoas, mas u’a maioria suficiente para se fazer notar. Comparem com o que vemos no nosso Brasil... mesmo nos arredores do 7 de Setembro. Voces observam esse tipo de patriotismo nas ruas, nas escolas, nas suas vizinhanças? Eu cheguei a presenciar na minha infância um Brasil diferente. Quando menino, meu pai sempre me levava para ver a parada do 7 de Setembro em São Paulo. Muita gente nas ruas, era um acontecimento, uma lição de civismo para este “menino”. Hoje não se vê mais isso... conversando com amigos e conhecidos, é considerado “brega” levar os filhos para ver a parada. O que será que aconteceu com o nosso país? Será que as instituições que representam o nosso país para o cidadão comum perderam o respeito? Será que as falcatruas, os escândalos constantes, a roubalheira desenfreada no poder público tem algo a ver com isso? Vão pensando, enquanto eu continuo. O Hino Nacional... hoje ouve-se ele no começo dos jogos de futebol, pelo menos em São Paulo. Alguns poucos jogadores o cantam, outros fazem questão de se mostrarem calados. Recentemente assisti uma entrevista com um deles onde o repórter perguntou por que êle não cantava... êle respondeu que achava “brega”... “brega”?!?! O que está acontecendo? Uma ocasião razoàvelmente recente eu tocava piano na casa de um amigo, e, nem sei bem por que, ataquei alguns acordes iniciais do Hino... houve vaias de alguns dos presentes... acharam “brega”... “brega”?!?! No Sábado passado, anterior ao 4 de Julho, eu voei de Chicago a Miami. Quando chegamos ao portão de embarque no aeroporto O’Hare em Chicago, a equipe de manutenção da American Airlines ainda estava no avião, e o embarque atrasou um pouquinho. Quando a equipe saiu do avião, um deles, um afro-americano, dirigiu-se ao balcão do portão de embarque, e pediu aos agentes para usar o microfone para anúncios aos passageiros que aguardavam para embarcar. Surpresos, os agentes lhe passaram o microfone, e ativaram os alto-falantes. Ele iniciou pedindo desculpas a nós pelo atraso, explicando que o serviço dele visava a nossa segurança, e que para uma modesta compensação pessoal, como era o início do fim-de-semana do 4 de Julho, ele entoaria uma canção para nós. Nesse momento, todos nós estávamos surpresos, inclusive e principalmente os agentes da American Airlines gerenciando o embarque, pois não sabiam o que estava por vir... Ato contínuo, aquele negro americano, pessoa simples, trabalhador pràticamente braçal, comecou a entoar em uma voz afinada, “a cappella”, o refrão da música “God Bless the U.S.A. (Deus abençoe os Estados Unidos da América)” escrita por Lee Greenwood nos dias que se seguiram ao ataque terrorista de 11 de Setembro de 2001: “And I'm proud to be an American (Eu tenho orgulho de ser um Americano); where at least I know I'm free, (onde pelo menos eu sei que eu sou livre); And I won't forget the men who died (E eu não esquecerei os homens que morreram); who gave that right to me, (e que deram esse direito a mim); And I gladly stand up next to you (E eu efusivamente me levanto junto a voces); and defend her still today, (e a defendo hoje ainda); 'Cause there ain't no doubt I love this land (Porque não há qualquer dúvida de que eu amo esta terra); God Bless the U.S.A. Ele foi aplaudido de pé, por passageiros que esqueceram completamente do atraso, muitos com lágrimas nos olhos. Eu fiquei imaginando... qual seria a probabilidade de que eu observasse uma cena similar em um aeroporto brasileiro...? Não necessàriamente alguem cantando o Hino Nacional, o que poderia ser considerado até ilegal, mas... Aquarela do Brasil, de Ary Barroso? Canta Brasil, de David Nasser, Coração de Estudante, Canção da América, ou Fé Cega, Faca Amolada, de Milton Nascimento? Ou ainda Meu Caro Amigo... ou Cálice, de Chico Buarque? Muito pouco provável. Mostramos patriotismo nos esportes, particularmente aqueles onde nos sobressaimos, e através deles mostramos seriedade, propósito. Quando falo de civismo aos adolescentes carentes do Horto Florestal, recebo de volta um certo torpor, como se me perguntassem: “o que há para se ufanar do Brasil como um todo?” Que instituições merecem o nosso respeito, se elas não fazem por serem respeitadas? Independência, que Independência...? E de quem? Talvez precisemos voltar um pouco aos dias da minha meninice, quando os Dragões da Independência cavalgavam no 7 de Setembro, e nos ufanávamos de sermos brasileiros, quem sabe divisar uma canção que diga Deus Abençoe o Brasil, para a juventude cantar no 7 de Setembro. Como vocês, leitores, falam de civismo e do Brasil aos seus parentes, amigos, colegas de trabalho, vizinhos...? Voces vão pensando nisso...
O autor é engenheiro, doutor em ciência da computaçao, professor universitário, e pode ser contactado através do e-mail claudio.spiguel@gmail.com). (PENSAMENTOS No 26/2011 – Jornal da Região – ANO XVII, No 930 – 08/07/2011).
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