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terça-feira, 28 de maio de 2013

O CONCURSO DE REDAÇÃO DA UNESCO – PONDO OS PINGOS NOS I’s





“O CONCURSO DE REDAÇÃO DA UNESCO – PONDO OS PINGOS NOS I’s”

A Internet, para quem tem acesso a ela, parece a “mãe” de todas as mídias, e ilude um pouco levando a pensar que seu alcance é maior do que realmente é, particularmente em um país emergente como o Brasil. Não se deve esquecer  que o acesso à Internet depende da disponibilidade de um computador (certo… ou um “tablet” ou um “smart phone”… todos computadores com nomes sofisticados) e rede de acesso, portanto em termos de Povo Brasileiro, como um todo, o alcance ainda é parco. 

Isso sem contar o nível de escolaridade e conforto básico no uso da tecnologia necessários para uma “navegação” bem-sucedida. Eu sei que vocês, leitores e leitoras, que sabem a minha formação (parágrafo no pé do texto), e principalmente aqueles que me conhecem pessoalmente, devem estar estranhando a abertura destes PENSAMENTOS, mas essa é a pura realidade. 

Se vocês querem ter uma idéia prática do que eu estou falando, vai aqui um exercício interessante: compareçam a uma agência bancária, na verdade em qualquer lugar, mas principalmente em uma cidade do interior, e observem por algumas horas o cidadão comum operar as máquinas automáticas para depósitos, retiradas, consultas, etc. Salvo raras exceções, o que se desenrola na sua frente parece mais uma sessão de “Vídeo Cacetadas”, ou da “Câmara Indiscreta”. E em um tom um pouco mais sério, descambando um pouco mais para a tragédia do que para a comédia, façam o exercício na primeira semana de um mês, e cheguem à tal agência bancária em torno da hora da abertura, quando se forma aquela loooonga fila de idosos que são forçados a receber suas aposentadorias e pensões usando cartões e senhas nas máquinas automáticas. É de dar pena… 

Ah, dirão vocês, mas os bancos, nossos “amigos” (“mui amigo”, como dizia o Jô Soares…), colocam aquelas mocinhas toda produzidas para ajudar com a tecnologia, e isso mostra um outro aspecto sombrio da tragicomédia que se desenrola, mais ou menos assim (o monólogo é da mocinha…): “Alô, Seu Azarias… trouxe o cartãozinho e a senhinha?... Isso… vamos ver aqui… Puuuxa, Seu Azarias, o Sr. só recebe issozinho??? Aaaaah, vamos lá dentro falar com o gerentinho, e ele faz logo um emprestimozinho para o Sr… o Sr. só põe a assinaturinha no papelzinho, e prontinho! O Sr. leva o DOBRO disso para casa, e a mensalidadezinha é descontada diretamente da aposentadoriazinha… o Sr. não precisa se preocupar…”  E lá vai o Seu Azarias, sem que ninguém tenha lhe falado o JURINHO que ele está pagando… Eu já escrevi sobre isso nesta coluna há um tempo atrás, vejam lá no meu blog: www.pensamentoscs.blogspot.com  

Mas saimos um pouco do tema… é nesse contexto da Internet que eu quero comentar sobre o concurso do título. Há vários anos está circulando na Internet uma mensagem anunciando que uma estudante brasileira venceu um concurso de redação da UNESCO concorrendo com ~50.000 candidatos, e o título da redação vencedora é: “PÁTRIA MADRASTA VIL”. Alguns esclarecimentos: o concurso foi promovido em 2006-07 pela UNESCO Brazil para estudantes de graduação nas Universidades brasileiras. Foi dado um tema básico para todos os candidatos: “Como Vencer a Pobreza e a Desigualdade”.  Foram recebidos 41.329 textos, dos quais 100 foram escolhidos para fazerem parte de uma publicação da UNESCO. O texto citado na mensagem é apenas UM desses cem, e foi submetido por  Clarice Zeitel Vianna Silva, que na época era estudante da UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro. Eu concordo que vale a pena divulgá-lo, e por isso faço-o neste veículo, adiantando que os outros 99 textos também proporcionam leitura interessante (http://unesdoc.unesco.org/images/0015/001576/157625m.pdf), desde que mostram o pensamento daqueles que representam o futuro do país. Vamos lá: 

“Pátria Madastra Vil: Onde já se viu tanto excesso de falta? Abundância de inexistência... Exagero de escassez... Contraditórios?? Então aí está! O novo nome do nosso país! Não pode haver sinônimo melhor para BRASIL. Porque o Brasil nada mais é do que o excesso de falta de caráter, a abundância de inexistência de solidariedade, o exagero de escassez de responsabilidade. O Brasil nada mais é do que uma combinação mal engendrada – e friamente sistematizada – de contradições. 

Há quem diga que "dos filhos deste solo és mãe gentil.", mas eu digo que não é gentil e, muito menos, mãe. Pela definição que eu conheço de MÃE, o Brasil está mais para madrasta vil. A minha mãe não "tapa o sol com a peneira". Não me daria, por exemplo, um lugar na universidade sem ter-me dado uma bela formação básica. E mesmo há 200 anos atrás não me aboliria da escravidão se soubesse que me restaria a liberdade apenas para morrer de fome. Porque a minha mãe não iria querer me enganar, iludir. Ela me daria um verdadeiro PACote que fosse efetivo na resolução do problema, e que contivesse educação + liberdade + igualdade. 

Ela sabe que de nada me adianta ter educação pela metade, ou tê-la aprisionada pela falta de oportunidade, pela falta de escolha, acorrentada pela minha voz-nada-ativa. A minha mãe sabe que eu só vou crescer se a minha educação gerar liberdade e esta, por fim, igualdade. Uma segue a outra... Sem nenhuma contradição! 

É disso que o Brasil precisa: mudanças estruturais, revolucionárias, que quebrem esse sistema-esquema social montado; mudanças que não sejam hipócritas, mudanças que transformem! A mudança que nada muda é só mais uma contradição. Os governantes (às vezes) dão uns peixinhos, mas não ensinam a pescar. E a educação libertadora entra aí. O povo está tão paralisado pela ignorância que não sabe a que tem direito. Não aprendeu o que é ser cidadão. 

Porém, ainda nos falta um fator fundamental para o alcance da igualdade: nossa participação efetiva; as mudanças dentro do corpo burocrático do Estado não modificam a estrutura. As classes média e alta – tão confortavelmente situadas na pirâmide social – terão que fazer mais do que reclamar (o que só serve mesmo para aliviar nossa culpa)... Mas estão elas preparadas para isso? 

Eu acredito profundamente que só uma revolução estrutural, feita de dentro pra fora e que não exclua nada nem ninguém de seus efeitos, possa acabar com a pobreza e desigualdade no Brasil. Afinal, de que serve um governo que não administra? De que serve uma mãe que não afaga? E, finalmente, de que serve um Homem que não se posiciona? Talvez o sentido de nossa própria existência esteja ligado, justamente, a um posicionamento perante o mundo como um todo. Sem egoísmo. Cada um por todos... 

Algumas perguntas, quando auto-indagadas, se tornam elucidativas. Pergunte-se: quero ser pobre no Brasil? Filho de uma mãe gentil ou de uma madrasta vil? Ser tratado como cidadão ou excluído? Como gente... Ou como bicho?" 

Clarice escreveu isso em 2006… algum de vocês, leitores e leitoras, viu isso divulgado na imprensa de massa (que não inclue a Internet)? A Clarice e praticamente todos seus 99 colegas contemplados falam em seus artigos da importância da educação. Será que o governo deu algum incentivo a eles como bolsas de estudos para se aprofundarem em suas àreas de interesse? Não que eu saiba… 

Enquanto estivermos sob um governo para o qual a educação e o mérito são contra-producentes, pois ele só consegue se manter no poder mantendo uma imensa massa ignorante interessada apenas em esmolas de cunho eleitoreiro, aliada a alguns poucos que têm educação mas são mal-intencionados, o Brasil continuará sendo o país do futuro que nunca chega. O Brasil continuará sendo a “Madrasta Vil” da Clarice e de todo o Povo Brasileiro, ao invés da “Mãe Gentil” do seu hino. Boa semana a todos.

O autor é engenheiro, doutor em ciência da computaçao, professor universitário, e pode ser contactado através do e-mail claudio.spiguel@gmail.com). 
(PENSAMENTOS No 21/2013 – Jornal da Região – ANO XIX, No 1027 - 31/05/2013).

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