Transcrevi na semana passada nesta coluna a primeira parte de um texto escrito pelo Professor de Direito em Belo Horizonte Igor Pantuzza Wildmann sob o título EU ACUSO. O texto é um tributo a outro Professor, Kássio Vinícius Castro Gomes, que acabara de ser brutalmente assassinado por um aluno por causa de uma nota baixa. Prometi a vocês, leitores, a segunda parte do texto nesta semana. Nela, o Prof. Wildmann continua ACUSANDO, no melhor estilo de Emile Zola. Vamos lá: “... EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual, finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã; EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com segundo grau completo cresceu tantos por cento; EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno terá direito de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia; EU ACUSO os que agora falam em promover um novo paradigma, uma nova cultura de paz, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da vergonha na cara, do respeito às normas, à autoridade e do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento; EU ACUSO os cabeça – boa que acham e ensinam que disciplina é careta, que respeito às normas é coisa de velho decrépito, EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis; EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como NÃO ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não podem aplicar a devida punição. EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam promoters de seus cursos; EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores. Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos -clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia. Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de o outro. A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo. Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor nova cultura de paz que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.” Vocês se lembram da pergunta que eu prometi responder há quatro semanas atrás nesta coluna, sob o título “AINDA SOBRE A (FALTA DE) EDUCAÇÃO”? Eu a repito aqui: Como é que nos últimos 60 anos fomos daquele calibre (exemplificado por minha sogra, Dra. Zuleika Picarelli Ribeiro do Valle, e eu mesmo, ambos frutos da educação pública brasileira de meados do século passado) para candidatos cujo currículo “nem chega a ser avaliado” (conforme mencionado pela profissional de Recursos Humanos Ana Paula Figueiredo Fernandes em artigo citado naquela mesma coluna de quatro semanas atrás, do caderno COTIDIANO da Folha de São Paulo de 11 de Abril p.p.)? Você concorda comigo, leitor, em que o texto do Prof. Waldmann responde perfeitamente essa pergunta, expondo em carne viva, como eu escrevi na semana passada, a PODRIDÃO em que se encontra a política educacional brasileira? E êle vai ainda mais longe, usando a política educacional como apenas um aspecto de uma PODRIDÃO AINDA MAIOR, o travesti que é a política de inclusão social brasileira baseada apenas em fatores quantitativos, sem qualquer atenção à qualidade do cabedal de conhecimento do país. A liderança sustentável de um país na Vila Global é diretamente correlacionada com o seu cabedal de conhecimento. Desde que eu me conheço por gente, eu ouço que o Brasil é o país do futuro. Hoje, com os valores totalmente invertidos conforme descrito pelo Prof. Waldmann, nem isso mais podemos dizer. É triste...
O autor é engenheiro, doutor em ciência da computaçao, professor universitário, e pode ser contactado através do e-mail claudio.spiguel@gmail.com). (PENSAMENTOS No 19/2011 – Jornal da Região – ANO XVII, No 923 – 20/05/2011).
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