Pepper |
Pepper |
Guaxupé já havia se acostumado a ver o meu filho Caio passeando com o seu cãozinho de estimação, o Pepper. Aquele cãozinho diferente, peludinho, de um cinza interessante, não-homogênio, barbudinho, simpático. Na verdade êle parecia aqueles mini-schnauzers que abundam no Brasil, mas não, não podia ser... êle era muito grande para ser um mini-schnauzer. Na verdade, Pepper era um STANDARD SCHNAUZER, uma das três variedades de schnauzers que existem: o MINI-SCHNAUZER, o STANDARD SCHNAUZER, e o GIANT SCHNAUZER. A diferença é pràticamente só o tamanho: os “minis” são cães de +/- 6 a 10 quilos, os “standards” são cães de +/- 15 a 20 quilos, e os “giants” são cães de +/- 30 a 40 quilos, da envergadura dos pastores alemães. A raça originou-se na Alemanha, e os arquivos mostram que a raça original foi mesmo o “standard schnauzer”, e os primeiros documentos que mencionam a raça datam do século XIV. As outras duas raças foram genèticamente “dirigidas” através de gerações consecutivas selecionadas com base no tamanho, para os menores em direção aos “minis”, e para os maiores em direção aos “giants”. São cães extremamente inteligentes, e de bom temperamento, sendo comum o uso deles, principalmente os “giants”, pela polícia alemã. Os documentos do século XIV descrevem os “standards” como cães cuja raça foi gerada como caçadores de roedores, conhecidos na gíria como “rateiros”, tanto que eram usados principalmente nos navios alemães, para caçar os ratos que porventura se aventurassem a bordo. Na descrição, é comentado que os criadores favoreciam nas gerações consecutivas o focinho (schnauzer em alemão) grande e barbudo, de modo a proteger os cães da reação das ratazanas quando eram por êles abocanhadas. A reação normal das ratazanas antes de morrer era virar e tentar morder o focinho do cão, e a barba espessa o protegia. E assim se criaram os schnauzers. Os Spiguels nunca possuiram navios, mas o Caio conseguiu convencer os pais dele que estava na hora de melhorar a família com uma presença animal para substituir o “springer spaniel” Alphie que êle e os irmãos tiveram enquanto cresciam. E assim foi que em 1997 começamos a pesquisar o temperamento das várias raças, e descobrimos os “standard schnauzers”. Se êles são raros no Brasil, êles também são raros nos Estados Unidos, embora um pouco mais comuns. Os poucos criadores que contactamos já tinham os filhotes das próximas ninhadas todos comprometidos, e foi assim que quase quando estávamos desistindo, em torno do Natal, um “link” de um criador novo apareceu na tela do meu computador com os dizeres: A NINHADA CHEGOU! Telefonei imediatamente e a senhora do outro lado da linha disse que um dos machos era um pouco menor do que o resto da ninhada, e por isso havia sido recusado pelo dono ao qual havia sido prometido, e estava disponível. O que mais me impressionou, porém, é que a tal senhora pràticamente conduziu uma entrevista comigo ao telefone, querendo saber sôbre a nossa família, por que queríamos adotar o cãozinho, e principalmente se prentendíamos ser criadores, ou seja, cruzá-lo com fêmeas da mesma raça, e à resposta negativa, nos fez prometer que iríamos castrá-lo para evitar que outros cães fossem gerados sem a infraestrutura de garantir donos responsáveis por êles. Abrindo um parênteses, isso é algo que nós, no Brasil, precisamos aprender, para evitar essa cachorrada que anda perambulando pela nossa cidade sem alimentação, doente, e gerando ainda mais cães sem donos. Mas voltando ao Pepper, que ainda não tinha esse nome naquela época, uma vez acertado que iríamos ficar com o cãozinho, a tal senhora me perguntou quando iríamos pegá-lo... em Marion, Ohio, no centro-oeste americano! Só aí eu me dei conta que a nossa casa no estado de Delaware, na costa leste americana, ficava a +/- 1.000 Km de onde estava o cãozinho. Perguntei se ela poderia despachá-lo de avião, e nós pagaríamos o transporte, ao que essa senhora que ganhava mais e mais o meu respeito a cada minuto que passava, foi categórica dizendo que ela não submeteria um filhote ao stress de tal transporte no meio do inverno rigoroso do norte dos Estados Unidos. Combinamos então que assim que pudéssemos faríamos a viagem de carro para pegar o filhote, e concordamos em uma taxa de manutenção, inclusive alimentação para que ela cuidasse do filhote no interim. Fizemos a viagem em Março de 1998, quando o filhote tinha pouco mais de dois meses... me lembro como se fosse hoje entrando no quarto onde êle estava dentro de um chiqueirinho, levantando as patinhas da frente para que eu o pegasse. Na viagem de volta, uma tempestade de neve nos pegou quando atravessávamos as montanhas “Poconos” na Pennsylvania, e a polícia rodoviária fechou a estrada em que trafegávamos por questões de segurança. Assim, todos que trafegavam na estrada, nós inclusive, começamos a procurar nas cidades da beira da estrada, pelos poucos hotéis e motéis, um para abrigar-nos na noite que se aproximava. Entramos em um e os quartos estavam sendo ocupados ràpidamente, mas um sinal dizia “no pets”, ou seja, não aceitavam animais. Reservei o quarto, e o Caio colocou o (agora já) Pepper dentro do casaco dele, e passou rapidinho pela recepção, e nós passamos a noite brincando com o Pepper para que êle não latisse e nos entregasse. Na semana passada Pepper faleceu, com quase 14 anos. Morreu como viveu, sem dar trabalho, durante a noite, dormindo. Descanse em paz, Pepper, e obrigado pelos muitos momentos de alegria que você nos trouxe...
O autor é engenheiro, doutor em ciência da computaçao, professor universitário, e pode ser contactado através do e-mail claudio.spiguel@gmail.com). (PENSAMENTOS No 38/2011 – Jornal da Região – ANO XVIII, No 944 – 14/10/2011).
Nenhum comentário:
Postar um comentário